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Mudança de ares para garantir a renda do apicultor

Produtores de mel do Litoral Sul levam abelhas para trabalhar na Serra catarinense
Por Vanessa Amando Em 24/01/2014 às 11:35

A fama de trabalhadeira que é atribuída às abelhas não é à toa. No Sul do Estado, elas fazem justiça e não descansam. Por interferência do homem, que faz das abelhas suas aliadas para obter trabalho e renda o ano todo, de fevereiro a agosto elas trabalham no Litoral para produzir mel a partir dos eucaliptos. Nos demais meses do ano, as abelhas sobem a Serra, sendo levadas pelos apicultores para produzir mel a partir das flores do Planalto. É a apicultura migratória, uma prática antiga e que garante, também, a manutenção da atividade.

Na Serra catarinense, as abelhas aproveitam o clima mais seco para produzir o mel a partir de flores silvestres, como a aroeira, bracatinga, carqueja e vassoura. Em torno de 40 mil colmeias são instaladas todo fim de ano pelos produtores do Sul na região serrana. Elas são distribuídas do município de Bom Jardim da Serra até Lages. Parte delas é levada pelos produtores da Associação de Apicultores de Içara (API).

De acordo com o presidente da API, o empresário Agenor Castagna, a cidade de Içara é uma grande produtora de mel na região, mas como as abelhas dependem das condições climáticas para trabalhar, é favorecida somente durante o período que corresponde ao Outono e ao Inverno, quando as abelhas produzem o mel na região litorânea. Por isso a necessidade de fazer o trabalho migratório.

Quando partem do Litoral para a Serra catarinense, as abelhas viajam, em média, 200 quilômetros. De forma mais técnica, o apicultor Alcides Rosso explica que a produção de mel na Serra é até mais lucrativa do que no Litoral porque na região serrana o sol nasce mais cedo e o pôr do sol acontece mais tarde, o que faz parecer que o dia é mais longo e, portanto, as abelhas trabalham por mais tempo. Anualmente, em torno de 52% do total de mel é produzido no Planalto e 48% corresponde à produção no Litoral.

Há 31 anos, o apicultor içarense Agilio Angelino Manoel realiza o trabalho de migração. Em setembro, ele levou em torno de 1,3 mil caixas de abelhas de Içara até os municípios de Fraiburgo e Lages, locais em que elas foram distribuídas pelos pomares de maçã, uma forma de apicultura mais refinada, a qual ajuda, ainda, na produção da fruta. Os insetos trabalharam até o fim de outubro e a colheita do mel iniciou em novembro.

Até o fim de janeiro, a expectativa de Manoel, ainda em plena atividade aos 64 anos, é retirar 18 toneladas de mel, o que ele considera bom para essa safra, como aconteceu em 2011. "Se dependesse somente da produção no litoral, com certeza teria que mudar de profissão, escolher outro ramo porque não teria nem como sustentar a família", enfatiza.

No Litoral Sul, do município de Passo de Torres até Imbituba, Rosso afirma que a apicultura é a base de sustento para cerca de 60 apicultores, cuja produção anual é realizada com uma média de 40 mil a 60 mil colmeias de abelhas, mas nem todos têm condições de migrar os insetos - no gráfico abaixo, confira como foi a produção de mel nas regiões litorânea e serrana do Sul catarinense dos anos 2007 a 2012. Os números de 2013 ainda não foram contabilizados.


Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)

Dentre os 60 apicultores do Sul, 34 estão ligados à API, associação que abrange os municípios de Cocal do Sul, Criciúma, Forquilhinha, Içara, Jaguaruna, Lauro Müller, Morro da Fumaça, Nova Veneza, Orleans, São Ludgero, Siderópolis, Treviso e Urussanga. Para a API, nos mesmos seis anos, a produção mais fraca foi em 2008, com pouco mais de 516 toneladas de mel; já a melhor safra considerada pelos produtores foi em 2012, com 713 toneladas de mel extraído.

O apicultor criciumense Nivaldo Milak sobe a serra. Ele está há 35 anos na produção de mel, trabalho que aprendeu com a família ainda na adolescência. Somente para o transporte e instalação das abelhas no Planalto, Milak ressalta que são gastos em torno de R$ 5 mil. “O processo de migração das abelhas é mais uma forma de manter a atividade viva. É preciso vencer estes desafios que são o custo de produção, o trabalho no campo, o custeio de mão de obra e sua disponibilidade até o preço para a venda. Sem contar as intempéries”, avalia.

O custo total da apicultura migratória, aos moldes aplicados no Sul do Estado, pode chegar em até R$ 20 mil. O quilo do mel é vendido pelo valor de R$ 4,80 até R$ 5, com expectativas de que chegue em até R$ 6 nessa safra. Além de toda Santa Catarina, os estados Rio Grande do Sul, Paraná e São Paulo também compram o mel produzido no Sul catarinense.

Hoje, junto com a esposa, Milak conta com orgulho que garantiu o sustento e os estudos dos dois filhos através da apicultura. Entretanto, aos 49 anos, ele acredita que não terá sucessores nesse tipo de trabalho, pois "os filhos não querem saber de abelhas, são de uma geração que pensa em estudar e depois trabalhar na frente do computador. Provavelmente somos a última geração de apicultores".

A expectativa de Milak, que se instalou em Urubici com a esposa, é produzir em torno de dez toneladas de mel nessa safra, a qual ele não considera muito boa devido às variações climáticas. Ele explica que, em 2013, o frio foi prolongado até novembro, quando houve, inclusive, geada na Serra catarinense, o que dificulta o trabalho dos insetos.

O clima seco deve ser o único fator favorável para a produção de mel, mas ainda seria preciso ter temperaturas mais elevadas para conseguir uma boa safra. Caso a previsão de Milak seja confirmada, o que é difícil fazer nesse ramo, a produção deve ter uma queda de até 50%, quando comparada com a safra anterior. Mesmo assim, o apicultor não desiste da atividade. Nem que seja preciso viajar com suas abelhas trabalhadeiras.

•    O clima quente e seco favorece o trabalho dos insetos;
•     Na Serra, a polinização acontece do mês de setembro até janeiro em flores silvestres, como aroeira, bracatinga, carqueja e vassoura;
•     De 40 mil a 60 mil colmeias são instaladas pelos apicultores do Sul na região serrana, de Bom Jardim da Serra até Lages;
•    A cidade de Içara concentra mais de 20 apicultores;
•    Do município de Passo de Torres até Imbituba são cerca de 60 apicultores, mas nem todos praticam a migração de abelhas;
•    Custo de transporte e instalação dos insetos na serra é de R$ 5 mil;
•    Custo total de até R$ 20 mil para todo o processo da apicultura migratória como é feito no Sul catarinense;
•    Quilo do mel pode ser vendido por R$ 4,80 a R$ 5;
•    Além de Santa Catarina, empresas dos estados Rio Grande do Sul, Paraná e São Paulo também compram o mel produzido no Sul catarinense para beneficiá-lo.

Fonte: Associação de Apicultores de Içara (API)

Fotos e vídeo: Ana Paula Cardoso
Arte gráfica e edição de vídeo: Marcelo Rossi Longo